Estudo liderado pela professora Débora Diniz afirma que livros didáticos mais aceitos pelas escolas públicas promovem a homofobia e pregam o cristianismo.
“O estímulo à homofobia e a imposição de uma espécie de ‘catecismo cristão’ em sala de aula são uma constante nas publicações”, afirma uma das autoras do trabalho, a antropóloga e professora do Departamento de Serviço Social, Débora Diniz.
A pesquisa analisou os títulos mais aceitos pelas escolas do governo federal, segundo informações do Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação. A imagem de Jesus Cristo aparece 80 vezes mais do que a de uma liderança indígena no campo religioso - limitada a uma referência anônima e sem biografia -, 12 vezes mais que o líder budista Dalai Lama e ainda conta com um espaço 20 vezes maior que Lutero, referência intelectual para o Protestantismo (Calvino nem mesmo é citado).
O estudo aponta que a discriminação também faz parte da tarefa. Principalmente contra homossexuais. “Desvio moral”, “doença física ou psicológica”, “conflitos profundos” e “o homossexualismo não se revela natural” são algumas das expressões usadas para se referir aos homens e mulheres que se relacionam com pessoas do mesmo sexo. Um exercício com a bandeira das cores do arco-íris acaba com a seguinte questão: “Se isso (o homossexualismo) se tornasse regra, como a humanidade iria se perpetuar?”.
A pesquisadora Débora Diniz alerta que o estímulo ao preconceito chega ao ponto de associar uma pessoa sem religião ao nazismo – ideologia alemã que tinha como preceitos o racismo e o anti-semitismo, na primeira metade do século XX. “É sugerida uma associação de que um ateu tenderia a ter comportamentos violentos e ameaçadores”, observa. “Os livros usam de generalizações para levar a desinformação e pregar o cristianismo”, completa a especialista, uma das três autoras da pesquisa.
LEI - Os números contrastam com a previsão da Lei de Diretrizes e Base da Educação de garantir a justiça religiosa e a liberdade de crença. De número 9475, e em vigor desde 1997, a lei regulamenta o ensino de religião nas escolas brasileiras. “Há uma clara confusão entre o ensino religioso e a educação cristã”, afirma Débora Diniz. A antropóloga reforça a imposição do catecismo. “Cristãos tiveram 609 citações nos livros, enquanto religiões afro-brasilieras, tratadas como ‘tradições’, aparecem em apenas 30 momentos”, comenta a especialista.
O estudo, realizado entre março e julho de 2009, ainda revela a tênue fronteira entre as editoras responsáveis pelas publicações e a pregação religiosa. A editora FTD, por exemplo, pertence aos irmãos Maristas, sociedade religiosa nascida em 1817, na França. O interesse comercial com o material escolar surge representado pelas editoras Ártica e Scipione, que formam a Abril de Educação, líder no mercado de livros didáticos no setor privado. “É esse contexto nebuloso de relações e interesses que envolve a pesquisa” diz Débora.
Ainda foram analisadas as editoras Saraiva, Moderna e Dimensão e as religiosas Vozes, Paulus Paulinas, Vida e Edições Loyola.
SEM REGULAMENTAÇÃO Para a psicóloga e uma das autoras do livro, Tatiana Lionço, os problemas do ensino religioso no Brasil vem da falta de regulação por parte do Estado. Ela explica que, antes de ir parar nas mochilas de crianças e jovens, todo material didático passa por uma avaliação de uma banca de profissionais do Programa Nacional do Livro Didático, vinculado ao Ministério da Educação. Todos, menos os de Religião. “Não há qualquer tipo de controle. O resultado é a má formação dos alunos”, comenta a professora. A especialista ainda questiona o modelo de ensino religioso nas escolas do país com base no princípio constitucional de que o Estado deveria ser laico (neutro em relação às religiões). “Se o Estado deveria ser laico, por que ensinar religião nas escolas?”, provoca. “Se a religião for tratada na sala de aula, tem de ser de forma responsável e diversificada”, acrescenta a psicóloga. As 112 páginas da publicação, lançada pelas editoras UnB e Letras Livres, ainda conta com a contribuição da assistente social Vanessa Carrião, do instituto de Bioética, Direitos Humanos e Gênero. |
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Textos: UnB Agência.
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